O termo Bem-Estar Animal, de acordo com a Organização Mundial de Saúde Animal, determina o estado físico e mental de um animal, e é intrínseco às condições de vida do mesmo. A avaliação do grau de bem-estar animal experimentado pelo animal, requer a análise conjunta de elementos e princípios cuja a seleção e valorização , muitas vezes implicam juízos de valor que devem ser elucidados pelo profissional avaliador. Elementos desejados para a manutenção do bem-estar animal são: garantia de cuidados veterinários adequados, prevenção de doenças bem como a manutenção da saúde, abrigo e ambiente seguro e estimulante, manejo e nutrição adequados, manejo correto na produção e porventura, técnicas adequadas de abate e abate humanitário (OIE).
O uso de animais implica uma responsabilidade ética, a profissionais e tutores, a fim de garantir o seu bem-estar na maior medida possível. As 5 Liberdades são diretrizes, que compõem os princípios básicos em que se baseia o bem-estar animal, e que devem direcionar o profissional na busca pela qualidade de vida dos animais. Estas orientações foram referidas pelo comitê Farm Animal Welfare Committee (FAWC) em 1979 e atualizadas em 2009, devendo ser asseguradas pela ética profissional e aplicadas através das técnicas recomendadas. As 5 liberdades, e as técnicas de aplicabilidades são:
É importante considerar que os animais não estão totalmente isentos de alguns estímulos negativos como, fome, sede, estresse. Entretanto, considerando Broom (1991), que afirma que o bem estar animal é medido pelo sucesso em sua tentativa de se adaptar ao ambiente em que vive, e as condições a que é submetido, bem como suas consequências, pode-se inferir que, quando é possível uma adaptação bem-sucedida, diante de condições adequadas ou naturais de ambiente e vida animal, o bem-estar é possibilitado.
Há relação direta entre níveis satisfatórios de bem estar animal com o aumento da produtividade e saúde do animal, estando diretamente ligada a benefícios econômicos, e bem-estar humano. As recomendações para elevação dos níveis, são baseadas em princípios científicos, como avaliação do grau de comprometimento funcional de doenças, lesões ou desnutrição bem como mudanças fisiológicas, imunológicas e comportamentais. Essas mudanças são avaliadas diante de preferências ou aversões, previamente avaliadas por tutores, proprietários ou médicos que acompanham o animal.
O Médico Veterinário deve conhecer e garantir a implementação e a manutenção de práticas relacionadas ao bem-estar animal, nos locais sob responsabilidade técnica do Médico Veterinário, bem como agir ativamente na prevenção de práticas de maus tratos e de crueldade sendo considerado o profissional capacitado para identificação, caracterização e diagnóstico das mesmas. Os casos identificados devem ser tratados observando-se os princípios morais e éticos e, as medidas implantadas devem respeitar os parâmetros de bem-estar animal, de forma específica para cada espécie, e o conhecimento técnico e legislação vigente no âmbito municipal, estadual e federal.
A Resolução Nº1,236/2018 do Conselho Federal de Medicina Veterinária, caracteriza os conceitos de crueldade, abuso e maus tratos, e determina, como infração ética, a prática direta ou indireta dos mesmos, e dispõe sobre os deveres profissionais diante de tais ocorrências. De acordo com o previsto nesta Resolução, é dever do Médico Veterinário manter constante atenção à possibilidade de ocorrência de maus tratos, e às condições de vida dos animais com que se relaciona no exercício da profissão. É dever do Responsável Técnico recomendar procedimentos de manejo, sistemas de produção, criação e manutenção, alinhados com as necessidades fisiológicas, comportamentais, psicológicas e ambientais das espécies, a fim de evitar atos de crueldade e maus tratos, garantindo o bem estar dos animais.
Sempre que houver suspeitas ou constatação de maus tratos ou condições que interfiram na manutenção do bem estar animal, o profissional deve registrar em relatório ou prontuário, tudo que por ele foi verificado, a fim de se eximir da participação ou omissão do ato danoso aos animais, e remeter o documento ao Conselho Regional de Medicina Veterinária, podendo este encaminhar o documento para as autoridades competentes tomarem as medidas consequentes necessárias.
É dever do Responsável Técnico orientar os proprietários ou tutores responsáveis, em seu local de atuação, a respeito da responsabilidade sobre as necessidades naturais e fisiológicas dos animais, bem como adoção de práticas que favorecem o bem estar animal, e a adequação de condutas que implicam em maus tratos, abusos e crueldade animal e suas consequências.
A Resolução nº 1.069/2014 do CFMV dispõe sobre Diretrizes Gerais de Responsabilidade Técnica em estabelecimentos de exposição, manutenção, adoção e venda de animais. As informações contidas nessa resolução, visam a promoção de segurança, saúde e bem estar dos animais, e cabe ao Responsável técnico, orientar ao proprietário do estabelecimento quanto às formas de adequação do ambiente e práticas de manejo para maior promoção de bem-estar dos animais sob sua responsabilidade e implementação do que rege a resolução.
O Responsável Técnico deve assegurar que as instalações de manutenção dos animais proporcionem um ambiente livre de poluição sonora, com luminosidade, ventilação e temperatura adequada, além de protegido contra situações que causem estresse a partir da promoção de enriquecimento ambiental efetivo . Os animais devem ter suas liberdades garantidas e poder expressar seu comportamento natural, livre de fome, sede, desnutrição, doenças, dor, desconforto, medo e estresse. Para que isso seja possível, os ambientes em que os animais permanecem, devem:
É estabelecido pela Resolução nº 1.069/2014 do CFMV que a inspeção diária do bem-estar e saúde dos animais em estabelecimentos de exposição, manutenção, adoção e venda, é obrigatória, e deve ser realizada pelo Responsável Técnico médico veterinário, ou por pessoal treinado. Os animais devem apresentar durante a inspeção comportamentos considerados normais para espécie, no que diz respeito a hábitos alimentares, ingestão de água, defecação, micção, manutenção ou ganho de peso, movimentação espontânea, e estarem livres de endo e ectoparasitos durante sua permanência no estabelecimento. Caso sejam verificadas alterações nos animais, elas devem ser comunicadas e registradas, e as medidas cabíveis devem ser adotadas. Caso sejam necessários cuidados veterinários estes devem ser realizados em ambiente específico, sem contato com o público ou outros animais.
Durante o transporte de animais vivos domesticados, por via terrestre ou marítima, deve ser assegurado o bem-estar durante a viagem, sendo essa, uma responsabilidade conjunta de todas as pessoas que participam das operações de traslado. Quando transportados em condições desfavoráveis os animais podem sofrer lesões, experimentar altos níveis de estresse ou morte. Cabe ao Responsável Técnico informar ao proprietário ou tutor sobre a importância e os benefícios de boas práticas de manejo dos animais no momento da viagem, o que deve ser orientado a partir do que é disposto no Código sanitário de Animais Terrestres da OIE e nas Leis e normas vigentes para transporte e exportação de animais domésticos, que podem ser consultados no Capítulo: Legislações de interesse do RT.
Segundo as recomendações da Comissão Técnica Permanente de Bem-estar Animal do MAPA, é muito importante que o tempo de viagem seja o mais curto possível, para minimizar o estresse experimentado. Os tratadores e pessoas responsáveis pelos animais durante a viagem, devem ser capacitadas para a execução do que for necessário e recomendado durante o trajeto. Além disso, os animais devem cumprir os requisitos de certificação veterinária, devem estar acompanhados dos exames e atestados exigidos pelos órgãos de Defesa Sanitária, e estarem aptos para a viagem.
Os locais de permanência dos animais durante o transporte e a densidade de carga animal devem ser adequados, e respeitados de acordo com as necessidades de cada espécie. O animal deve ter acesso a água e alimentos antes da viagem, e a água deve ser oferecida a cada 12 horas após o embarque, como prazo máximo para animais adultos que não estejam em lactação. Os animais devem ser inspecionados 30 minutos antes da partida e a cada 2 horas durante a viagem. O transporte de animais gestantes e fêmeas recém paridas deve ser evitado sempre que possível (EMBRAPA).
O uso científico de animais é feito através de práticas de experimentação para fins didáticos ou de pesquisa. A lei nº 11.794/08, que dispõe sobre procedimentos para o uso científico de animais, criou o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal – CONCEA, visando garantir a implementação dos procedimentos dispostos em lei. O CONCEA, que tem sua competência disposta no artigo 5º, é responsável por formular e fiscalizar o cumprimento das normas relativas à utilização humanitária de animais com finalidade de ensino e pesquisa científica em centros de bioterismo e laboratórios.
Para fins de controle e fiscalização, também foi instituído que os Comitês de Ética no Uso de Animais – CEUA´s, devem existir em todas as instituições que fazem uso de animais em experiências científicas, e garantir que os métodos e protocolos adequados sejam utilizados, bem como, tomar as devidas providências diante de práticas não humanitárias.
O princípio dos “3 R’s”, são diretrizes internacionais desenvolvidas pelos pesquisadores Russell e Burch para o Livro "The Principles of Humane Experimental Technique", de 1959, que fornecem métodos para a realização de pesquisas com animais de forma mais humana. A partir de sua publicação, o conceito “3R’s”, foi disseminado e inserido em regulamentos e legislações internacionais e na prática de profissionais que trabalham com animais ao redor do mundo, podendo ser adaptado para diversas áreas de atuação do responsável técnico. Atualmente, a inclusão de R 's adicionais vêm sendo discutidas, como por exemplo Respeito, Responsabilidade, e Reabilitação. Os 3 R’s iniciais e suas implicações são:
O COBEA (Colégio Brasileiro de Experimentação Animal), inseriu o conceito 3R’s como parte dos Princípios Éticos para a experimentação animal:
“Artigo VI - Considerar a possibilidade de desenvolvimento de métodos alternativos, como modelos matemáticos, simulações computadorizadas, sistemas biológicos "in vitro", utilizando-se o menor número possível de espécimes animais, se caracterizada como única alternativa plausível”
As atribuições do RT Médico Veterinário em estabelecimentos que criem ou utilizem animais em atividades de pesquisa ou ensino foram estabelecidas através da Resolução Nº 1.178 de 17 de Outubro 2017 do CFMV.
O bem-estar dos animais destinados ao consumo humano deve ser garantido durante todas as etapas que precedem e permitem o abate. O transporte, acomodação, contenção e abate não podem causar sofrimento ou estresse desnecessário (OIE). Os Responsáveis Técnicos veterinários devem assegurar que os abatedouros sob sua responsabilidade tenham um plano específico de manejo, cujo objetivo é manter um bom nível de bem-estar em todos os estágios de produção dos animais até que estes sejam abatidos.
O Regulamento Técnico de Manejo Pré-abate e Abate Humanitário e os métodos de insensibilização autorizados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, foram aprovados pela Portaria de Nº 365, de 16 de Julho de 2021, e instituíram, dentre outras recomendações, que os animais destinados ao abate devem ser submetido a procedimentos humanitários de manejo que garantam o bem-estar, e que locais que desenvolvam atividades de abate devem designar um Responsável pelo bem-estar animal, que deve ser capacitado para o manejo pré-abate e abate humanitário específico das espécies animais abatidas na unidade industrial.